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NOTA DE RETRATAÇÃO

 

A Comissão Organizadora lança nota pública de retratação perante às pessoas trans pelas situações originadas a partir da publicação do edital de divulgação das pessoas isentas no XII ENUDS-MOSSORÓ.

 

Em publicação do edital supramencionado, a Comissão Organizadora veiculou os nomes civis das pessoas trans que haviam solicitado a isenção dos custos de inscrição. Acontece que tal atitude foi questionada por pessoas trans que denunciaram a publicação como grave violação de direitos humanos e um erro político de natureza inadmissível em um encontro que tem como principal objetivo a construção de outro modelo de sociedade que enxergue as pessoas como sujeites de direito, através da articulação da militância LGBT de dentro e fora das universidades.

 

A Comissão Organizadora busca esclarecer o ocorrido e lançar mão de seu posicionamento político diante de toda a situação. A priori, deixamos claro que não é nossa intenção justificar o erro, muito menos minimizar sua gravidade. Nosso intento é de tornar clara a situação, tentar colaborar com os necessários debates que entendemos que devem ocorrer dentro encontro, bem como reforçar nosso compromisso com a luta contra todas as formas de opressões e violações de direitos.

 

Após o prazo estipulado para o pedido de isenção do pagamento da inscrição, a Comissão Organizadora, através da comissão de inscrição e credenciamento, elencou os nomes de todas as pessoas requerentes (nomes civis e sociais) e fez uma lista que seria posteriormente publicada. Acontece que a lista não foi apreciada por toda a Comissão Organizadora, tendo se concentrado nas mãos de poucas integrantes da comissão de inscrição e credenciamento. Este foi o primeiro equívoco. Na ansiedade por encaminhar o máximo de pendências, a lista não foi revista por toda a Comissão, o que resultou em sua publicação nos moldes em que foi realizada. O objetivo era termos uma lista com nomes civis e sociais para controle administrativo e uma apenas com os nomes sociais (que seria publicada).

 

À primeira vista, nada de muito esclarecedor. Necessário é acrescentar o fato de que a Comissão hoje está composta por uma diversidade de pessoas que entraram durante o processo inicial de construção do Encontro e que de lá para cá não temos conseguido realizar constantes formações políticas sobre a pauta LGBT. Neste sentido, torna-se difícil equilibrar os conhecimentos, até mesmo de pessoas que já integram o coletivo há mais tempo.

 

Trazemos esses fatos para dizer que reconhecemos que de nossa parte o erro tem duas origens principais: a ausência em alguns momentos da necessária organização para vencer as tarefas sem atropelos e a não articulação de formações que suprissem as deficiências teóricas que se apresentam. É oportuno ressaltar que enquanto coletividade, avaliamos estas deficiências não no campo individual, mas de grupo.

 

Em virtude do anteriormente exposto, enquanto Comissão Organizadora não consensuamos sobre a gravidade do fato, mas reconhecemos a legitimidade das vozes de cada pessoa trans que se sentiu violada e violentada através da exposição pública de seu nome civil.

Esta Comissão Organizadora não se furta de suas responsabilidades, mas acredita na importância de se realizar alguns apontamentos para que possamos enriquecer o debate e conseguir construir soluções dentro deste espaço tão rico, valioso e que nos é tão caro, o ENUDS.

 

Dizemos que o Encontro não é nosso, estamos apenas tentando viabilizar logisticamente a sua realização. Certas de nosso compromisso enquanto Comissão Organizadora, estamos tentando a todo custo garantir as condições estruturais necessárias para a realização da edição Mossoró. Contudo, somos do pensamento que acredita que o encontro deve ser pautado por toda a Comissão Nacional, posto que é ela composta por vários coletivos, garantindo melhor representatividade e pluralidade de ideias, não devendo furtar-se das obrigações assumidas durante sua constituição. Neste sentido, apontamos a responsabilidade da CN pelo não acompanhamento com o devido cuidado que deve ter sobre o ENUDS. E fazemos esse apontamento não de forma irresponsável e agressiva, mas como uma constatação da necessidade de pensarmos mecanismo de fortalecimento desta comissão, posto que esse fortalecimento confere maior e melhor representatividade, bem como aprimora as experiências de construção coletiva e diversificada.

 

Diante de falas proferidas em redes sociais sobre a construção da alternativa do boicote ao encontro, afirmamos a nossa convicção de que, por estarmos em uma sociedade de classes, a disputa política não cessa, consistindo a política de boicote a opção menos positiva para um grupo que se enxerga submetido a opressões, principalmente por ser este um espaço propício para a construção da luta contra as hegemonias e suas opressões. Acreditamos que o ENUDS é um espaço em que as pessoas não vêm com o intuito de reproduzir e legitimar opressões. Quando recaem nessa postura é porque faltou, na melhor das hipóteses, maturidade teórica/prática/política. E mesmo diante destas possibilidades, entendemos a pessoa em sua individualidade como sujeitx em disputa. Nossa tática está orientada pela disputa constante de corações e mentes, não cabendo o abandono de nenhum espaço de construção das lutas contra-hegemônicas.

 

Não queremos aqui ditar como devem as pessoas agir em suas lutas, mas lançar mão de nossa orientação política. Orientação esta que foi crucial para que decidíssemos pela disputa deste Encontro após a dissolução de parte da Comissão Organizadora inicial do XII ENUDS.

Não fosse a disposição à disputa de espaços, jamais conseguiríamos ocupar o que é nosso, do povo.

Entendemos que é necessário discutir a presença da Comissão Nacional dentro da organização dos ENUDS e, especificamente nesta edição, que as pessoas trans estejam aqui falando e se fazendo ouvir, para que aparemos as arestas das opressões que ainda se reproduzem em nossos espaços.

Reiteramos nosso compromisso com a luta LGBT e, especificamente, com a das pessoas trans, não sendo esta menos importante e urgente do que nenhuma outra. Nós, enquanto CO, levantamos e sustentamos a bandeira de políticas para incentivar a participação de pessoas trans no ENUDS. Resultado disto foi a adoção da política de isenções. Mesmo não havendo consenso sobre ser a melhor ou mais adequada política de incentivo, a adoção da mesma representa um primeiro passo para o reconhecimento da necessidade de construirmos a inserção e a visibilidade. Quanto ao mérito, teremos sempre os espaços do próprio encontro para discutir e rediscutir nossas políticas e nossas atuações.

 

Quanto à demora em publicarmos uma nota de retratação e explicação, só nos resta dizer que não tem sido fácil dar conta de trabalhar, nos sustentar (porque muitas de nós não é da cidade e tem que se virar pra se manter), cursar faculdade, militar nos espaços estudantis, partidários e autorganizados, e acrescentar às nossas obrigações a responsabilidade pela construção de um encontro nacional. Sabíamos que precisaríamos de esforços redobrados e não nos arrependemos, apenas esperamos compreensão e colaboração de todas, posto que como dissemos anteriormente, este encontro não é nosso, mas de todas nós.

 

Esperamos ter escurecido os acontecimentos e reiteramos nosso sincero pedido de desculpas a todas as pessoas que se sentiram violadas e violentadas pela falha cometida. Estamos trabalhando para proporcionar a estrutura necessária para mais um ENUDS e contamos com a participação de todas as pessoas que lutam na construção de uma sociedade anticapitalista, anticlassista e que condene e elimine todas as formas de opressões.

 

“E eu não quero odiar meu corpo por isso. Meu corpo não está errado. A maneira como as pessoas falam sobre o meu corpo é que está errada. Mas meu corpo é a única coisa que eu posso mudar.

Então parem de me chamar de doente. Parem de olhar para o meu corpo e me acorrentar a qualquer coisa que você pensa que eu sou. Eu não nasci no corpo errado.

Eu nasci num mundo que não sabe o que o meu corpo significa.”

Ollie Renee é um poeta queer.

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